À deriva
(Anônimo)
A poesia do teu corpo –
O teu olhar derramado sobre o meu,
A tua carne enlaçada à minha –
Entorna-se em mim
Com toda a tua grandiosidade oceânica;
Ondas de desejo se avolumam,
E quebram.
Quebram-me.
E recuam vagarosas,
Arrastando cada pedaço de mim,
Cada grão de areia.
Meu corpo, nu e indefeso,
Mergulha na tua profundeza,
Escura e misteriosa.
Minha carne incandescente
Evapora cada gota da tua poesia,
Na (vã) tentativa de livrar-me de ti.
Mas resta um rastro de sal.
Um resto do teu suor salgado,
Do teu mar.
(E em ti, espero,
Resta um pouco dos grãos
Que arrancaste de mim,
Quem sabe por vontade,
Por vaidade,
Ou por pura inocência).
Deste rastro de sal, contudo,
Surge um incêndio
Que me impele a naufragar em ti.
É do teu resto em mim
Que explode um desejo que beira a lascívia –
Ou, talvez, a loucura –
Que me faz transbordar em mim
E me perder em ti.
Em tua poesia,
Fluida e (in)constante,
Delicio-me e, enfim,
Afogo-me.